O rei Tchongolola Tchongonga Ekuikui VI, soberano do maior grupo étnico da Angola, o Reino de Bailundo, desembarca pela primeira vez em Salvador, para celebrar os profundos laços históricos e culturais com essa cidade que carrega o cordão umbilical fora da África. Durante a agenda oficial, o monarca será recebido no MUNCAB (Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira) neste domingo (24), onde participará de uma visita guiada à exposição “Raízes: Começo, Meio e Começo”, que reverencia a influência angolana na formação da identidade brasileira.
A visita histórica marca o reencontro simbólico com os filhos de Angola em território baiano. “Esse movimento reafirma nosso papel como um espaço de diálogo e preservação da memória que conecta o Brasil ao continente africano. Nesse contexto, assumimos a missão de conscientizar os brasileiros sobre a nobreza de suas origens, representadas por Rainhas e Reis africanos que lideraram impérios marcados pela eficiência e sabedoria, oferecendo lições valiosas de governança que permanecem relevantes na contemporaneidade”, qualifica Cintia Maria, diretora-geral do MUNCAB.
Idealizado em 2002, o MUNCAB mantém iniciativas que promovem o intercâmbio artístico com Angola, fortalecendo o diálogo entre as culturas africana e afro-brasileira. O equipamento museal sedia exposições que destacam a herança angolana, a exemplo de “Raízes: Começo, Meio e Começo”; é plataforma para a circulação do trabalho de artistas angolanos no território brasileiro; promove treinamentos para a população sobre a centralidade da cultura banto, grupo etnolinguístico de Congo, Angola e Moçambique, na identidade brasileira; e recebe visitas oficiais de delegações angolanas para fortalecer os laços diplomáticos.
Luandino Carvalho, adido cultural da Embaixada de Angola no Brasil e diretor da Casa de Angola na Bahia, também ressalta a representatividade da visita. ”O simbolismo desta digressão é reforçado por ser em novembro, mês da Independência de Angola, feito histórico reconhecido pelo Brasil na primeira hora em 1975. De resto, não temos dúvida da importância desta visita como um momento de elevação cultural espiritual e de enaltecimento à ligação ancestral entre os povos de Angola e do Brasil, temática esta que é a divisa da Casa de Angola na Bahia e que tem dado frutos como a ligação de irmandade com o MUNCAB”, comemora.
Herança angolana em Salvador
A migração forçada de angolanos para a Bahia é dividida em quatro períodos: as primeiras embarcações no século XVI (1550-1575) partindo de Luanda, rota direta para o porto de Salvador, para o cultivo de açúcar nos engenhos do Recôncavo. A consolidação do tráfico transatlântico no século XVII (1620-1648), com Salvador como primeira capital do Brasil, maior entreposto escravista das Américas, onde práticas religiosas angolanas moldam a identidade colonizada. O auge do tráfico e da resistência a partir do século XVIII (1700-1800), com quilombos e confrarias preservando a cosmogonia angolana. Finalmente, o declínio do sistema escravista no século XIX (1830-1888), abolido oficialmente pelo Império do Brasil.
Com a abolição da escravidão, a população afrodescendente na Bahia, predominantemente de origem angolana, continuou a moldar profundamente a cultura local. “A exposição ‘Raízes: Começo, Meio e Começo’ destaca os saberes, a resiliência e a espiritualidade que emergiram do povoamento de Salvador pelos angolanos. Trata-se de uma celebração à cosmovisão que, mesmo arrancada de seu território de origem, resistiu, floresceu e contribuiu para formar essa cidade, que hoje abriga o maior contingente de descendentes de angolanos fora da África”, contextualiza Jamile Coelho, curadora da mostra e diretora artística do MUNCAB.
“Raízes: Começo, Meio e Começo” apresenta cerca de 200 obras de artistas negros, incluindo instalações, pinturas, fotografias, esculturas e outros trabalhos contemporâneos. A expografia, dividida em cinco núcleos, explora a riqueza dessa herança. No núcleo “Origens”, a instalação de um baobá, chamada “árvore da vida”, simboliza a sabedoria ancestral africana. O eixo “Sagrado” aborda o culto aos nkisis, forças espirituais de matriz angolana conectadas à ancestralidade e à mitologia da natureza.
A influência do kimbundu e do kikongo no português da Bahia, com termos como moleque, cafuné e quitanda, é tema do núcleo “Ruas” e sua relação com o “pretuguês”. “Bembé do Mercado” destaca práticas de solidariedade comunitária enraizadas nas tradições angolanas. Já o núcleo “Afroturismo” evidencia o protagonismo preto em mitologia, ficção científica e realismo fantástico.
Ekuikui VI
Aos 39 anos, o rei Tchongolola Tchongonga Ekuikui VI é o 37º soberano do reino subnacional do Bailundo, localizado na região central de Angola. O Reino do Bailundo foi Estado pré-colonial africano dos povos Ovimbundos e surgiu no Planalto Central de Angola em meados de 1700. O rei Ekuikui VI é formado em Direito, além de ser poliglota: fala quatro línguas, sendo uma delas o Umbundu, língua oficial do Reino do Bailundo. O rei ainda tem fluência nas línguas francesa, portuguesa e inglesa.
Reino do Bailundo
O Reino do Bailundo surgiu em meados de 1700 e foi um estado nacional africano, dos povos Ovimbundu, dotado de poderes políticos e econômicos. O Reino encontra-se localizado no Planalto Central de Angola, e abrange as províncias do Huambo, Benguela, Kwanza Sul, Bié e uma parte da Huíla. Quando surgiu o Reino do Bailundo? No princípio o nome era Halavala, deu-se este nome devido a sua localização geográfica que estava próximo de um monte. Posteriormente mudou-se o nome para “Mbalundo” devido ao uso de jóias, bijuterias que o povo tinha o costume de usar, estes acessórios chamavam-se Ombalundo. O Reino comporta um palácio real, 35 residências para os membros da corte e jangos que servem para julgamentos tradicionais que ajudam a resolver os problemas sociais que ocorrem na aldeia.
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